quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

os seus olhos


...a voz calou-se mas os olhos falaram tudo o que lhe estava contido na alma.  A dura vida que levara, a contínua solidão da qual se queixava mais do que a fome e a morte da única paixão, tão cedo perdida, tinham-lhe consumido toda a alegria da viver...

(início de conto...)
dez 2011

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

people

People who are usually the strongest are usually also the most sensitive

People who exhibit the most kindness are usually the first to be mistreated

The one who always takes care of others is usually the one who needs to be cared the most? 


segunda-feira, 31 de outubro de 2011

todas as manhãs...

Todas as manhãs trazes-me a luz do sol,
os cheiros das ervas e das flores,
o odor da maresia, recem colhida do mar
trazes-me também, o turbilhão de rasgos brancos
que os aviões neste hemisfério deixam no azul transparente do céu

Todas as manhãs agradeço estas dádivas que me trazes
e caminho no teu encalço.

trilho carreiros inúteis de vida
levando a tua memória como força
dentro do meu peito

Todas as manhãs a tua lembrança me alumia,
me faz sorrir, sozinha,
recordando sonhos de um outro tempo, não há muito passado.
sonhos que alegram por momentos o meu espírito
mas deixam-no cheio de angústia e saudade

Todas as manhãs caminho para ti,
em direcção à linha do horizonte,
passos que tropeçam nos escolhos do dia-a-dia,
passos incansáveis que me transportam
para ti, lá bem ao fundo…

Todas as manhãs renasço,
uns dias como nuvens no céu de verão,
fiapos que se deslocam embaladas por um vento suave
que cruzam o azul celeste;
outros dias, mais invernosos,
como nuvens cinzentas e pesadas
empurradas por fortes vendavais
que se convertem em gotas
e enchem o meu temporal

Todas as manhãs a tua memória vem até mim
E, em entre-sonhos torna-se verdade,
estás aqui ao meu lado
amando-me com paixão,
com juras de eternidade,
till death do us part

Todas as manhãs creio-te a meu lado
procuro o calor e a presença do teu corpo,
o teu afago matinal

pura utopia

Todas as manhãs... desperto!

domingo, 30 de outubro de 2011

o medo ... global



Texto de Mia Couto numa conferência sobre a segurança

"os que trabalham têm medo de perder o trabalho
os que não trabalham têm medo de nunca encontrar trabalho
quando não têm medo da fome têm medo da comida
os civis têm medo dos militares
os militares têm medo da falta de armas
e as armas têm medo da falta de guerras"

há quem tenha medo que o medo acabe!!

sábado, 29 de outubro de 2011

a fala






A fala, antes de se encher de palavras, deve permanecer qual mamífero doloroso no fundo de um ventre; aí adquire o direito de ter um sentido, de ter um som, de ter um sangue.
(Alain Bosquet)

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

sermão do bom ladrão


Corria e decorria o período quaresmal do Ano da Graça de 1655 em Lisboa. Na Igreja da Misericórdia, postavam-se, em solene recolhimento, Dom João IV, o rei, os seus ministros, os seus conselheiros e os seus magistrados. Com uma lacerante concepção do mundo, da história, do Estado, da Sociedade e do Evangelho, levanta-se António Vieira, o pregador. Começou por advertir Sua Majestade e os seus próximos de que a prédica mais se adequaria à Capela Real, já que incidiria sobre questões de poder e corrupção, opulência e indigência, adulação e mistificação. Mas quiseram as circunstâncias que a Palavra da Luz se fizesse ouvir na Conceição Velha. Corre e decorre o Ano da Graça de 2011 e o sermão mantém-se pertinente, bastando substituir a Índia por União Europeia, o rei por presidente, os ministros por ministros, os conselheiros por assessores, os magistrados por magistrados.

Vamos falar, hoje, do Público e do Privado, do Mal e do Bem. Na verdade, tudo o que é público é tido por vergonhoso: um roubo sem ornatos de benemerência, o incesto badalado na vox populi, as lamúrias nas filas de espera dos hospícios. Já o Privado é prenhe de virtudes: enriquece preferentemente em silêncio (e o enriquecimento lícito é mais chocante e pernicioso do que o ilícito), destaca anjos da guarda para operações criminosas, socorre donzelas em maus lençóis e maleitas brasonadas em clínicas discretas. Voltemos, no entanto, à missão profética e à iniciação ética dos Governos. Vossa Majestade deverá distanciar-se dos desmandos que se cometem em Vosso Nome e deverá recusar prendas bajulatórias, já que VM jurou cumprir e fazer cumprir a Constituição, vertida, nas Cortes Gerais, em defesa das classes desfavorecidas e pervertida, nas aplicações correntes, pelas classes favorecidas. Quero valer-me desta quadra que, embora pós-quaresmal, não deixa de ser de jejum e penitência, de luto imposto pelos argentários, para aconselhar os seus ministros, os seus assessores e os seus magistrados a fornecerem a VM os Relatórios da Fazenda Pública, do Tribunal de Contas e dos Ouvidores das Praças. Neles consta que o maldito défice público se transformou em bendito superávite privado. Verá, com seus próprios olhos, que, mui patentemnente desde 1986, se desvaneceu a linha que separa a administração da usurpação. Não haveria, hoje, este abalo nas Finanças e esta perda de independência e sobretudo este clamor social se milhares de milhões em impostos não tivessem prescrito, se milhares de milhões não houvessem contornado o Estado na economia paralela, se milhares de milhões não se tivessem injustificado em aditamentos de adjudicações, se milhares de milhões não houvessem sido aplicados em vasos de guerra em vez de indústrias da paz, se milhares de milhões não tivessem esquecido as necessidades primárias e lembrado as sumptuárias, se milhares de milhões se houvessem acautelado nas privatizações, se milhares de milhões vindos da Europa tivessem merecido acompanhamento cívico e judiciário, se milhares de milhões não se tivessem evadido para paraísos infiscalizáveis. O confirmará nas auditorias se houver alguma verticalidade na coluna do Reynno e alguma decência nas vestes da Corte.

Entretanto, o Bom Ladrão Privado esforça-se por convencer assalariados, pensionistas, desempregados, consumidores, contribuintes, eleitores e sobretudo os pobres em Ciências do Ter & do Poder de que o Público é a raiz do mal, apesar de tão grande Riqueza Privada não existir sem tamanha Pobreza Pública. Por isso, não estranhe VM a campanha dos Boletins & dos Cornetins: o Estado não tem vocação para administrar, cabendo-lhe transferir o Orçamento para os Privados, estabelecer parcerias em que aceite perder para gerir bem. Clamam ainda as trombetas de Jericó, a começar pelos corneteiros de El'Rei, que o Estado é mau pagador. Dramatiza-se – Céus! – o Calendário de Incumprimento da Administração Central e da Administração Local: seis meses em média. Chegam a acusar o Estado como causador-mor das insolvências particulares. Não estão, porém, Majestade, empenhados em mostrar o que empresas e privados devem ao Estado, tornando-o insolvente. Também não os preocupa quanto os privados devem entre si, bem como o respectivo Calendário de Incumprimento e os Anexos de Incobráveis. Majestade, quem emite milhares e milhares de cheques sem provisão neste país onde a Palavra nada abona nem a barba nada cauciona? Quem não honra milhões de contratos? Inúmeros empreendedores. Também a Iniciativa Privada fecha milhares de portas, numa rotunda manifestação de superioridade do privado sobre o público. Todos os anos, no Dia dos Fiéis Defuntos, Vossa Majestade inauguraria o maior cemitério da Grei se as empresas e as famílias que tombam por incapacidade da gerência ou lógica trucidante dos mercados coubessem nas sepulturas e as suas contas num epitáfio. É o Privado – creia Majestade – que ostenta a Coroa da Glória a defraudar o Estado e o Privado, que reduz e atrasa salários, que fecha empresas por SMS e arregimenta esquadrões da Guarda Real e da Segurança Privada para cortar o passo ao desespero dos espoliados e à indig(nação) dos ludibriados. Mas os Boletins & os Cornetins açulam as almas. Reflecti: traçam cenários de falência do Serviço Nacional de Saúde. Apontam alguns casos e escondem outros casos. Manejam o método dos sofistas: a ADSE não é expedita a pagar aos hospitais e os hospitais não honram os compromissos com os fornecedores. Senhores ministros, assessores e magistrados, mas as Seguradoras Privadas deixam arrastar as dívidas aos hospitais e os arautos da insustentabilidade não pedem ou sugerem a nacionalização dos Seguros.

Noto pelo sobrolho de Vossa Majestade e pela rigidez de porte – o Infalível o saberá – algum enfado. Espero que seja postura de protocolo: na sua infinita misericórdia, o Altíssimo convidou-Vos, abrindo a Casa do Poder Intemporal ao Poder Temporal. Mas temendo ser pouco cerimonioso e parcimonioso não alongarei a pregação. Rematarei o Verbo com uma ocorrência que não se situa no antanho mas caberia nos tombos das rotas das Índias e do Brasil, dos desfalques e das especiarias, dos ferros dos escravos e dos metais preciosos. Ouviu VM alguma murmuração sobre o BPN, entidade com alvará de 1993, lavrado por seu egrégio Governo. Foi um covil de ladrões. O erário público já sangrou mais do que Cristo no Calvário para pagar e apagar malfeitorias, algumas com inovação nas artes de furtar. Corria e decorria um domingo do Ano da Graça de 2008 e o banco foi nacionalizado. Os lucros ficaram nas mãos dos delinquentes e os prejuízos nas mãos do Estado. Corria e decorria um domingo do Ano da Graça de 2011 e o banco foi reprivatizado. O facto dos agentes do Estado actuarem pela calada, no dia que Deus destinou ao repouso, é matéria de suspeita, a apurar no Juízo Final. De momento, cumpre-me alertar VM para os obscuros negócios da pátria, ilustrados por esta fábula de colarinho branco: foi o BPN constituído e gerido por um elenco em boa parte saído de seus Governos. Houve uma tentativa frustrada de reparo dos rombos, empreendida também por um Vosso ex-ministro, mas apenas levou consigo 10 milhões pelo intento de reparação. A Caixa Geral de Depósitos, do Estado Português, com autorização dos ministros e assessores do Reynno e presta e digna assinatura régia, perdeu milhares de milhões de euros neste naufrágio das Novas Índias. Presidia à Caixa um Vosso ex-ministro. Agora, também um Vosso ex-ministro encabeça a compra dos despojos da embarcação, declarando que o Estado fez um interessante acordo, apesar de existir uma contraproposta de 100 milhões, que não previa saneamentos de funcionários nem encerramentos de balcões. Majestade, ministros, assessores, magistrados, assevera o último ex-ministro em cena que os contribuintes poderão respirar: o BPN sairá da órbita do Estado. A que preço? Por 40 milhões de euros: menos de metade do estádio de futebol de Braga, cidade de igrejas e mesquitas. Mas como garantir descanso aos contribuintes se está em curso uma recapitalização de 550 milhões, se as eventuais rescisões serão suportadas pelo Estado, se os subsídios de desemprego e a interrupção das contribuições em sede de Segurança Social e IRS afectarão os cofres do Reynno e engrossarão as falanges dos inactivos? Só metade dos marinheiros é arrojada às vagas apregoa o recém-graduado capitão, com ar humanitário, a boca rendilhada de espuma. Não espanta: o mar está embravecido e ele, animoso, manobra da casa das máquinas à coberta. Apanha com as vagas em cheio. Gagueja mas não larga o leme. Insufla ânimo aos marujos apavorados e aos clientes espavoridos. O BIC lançará coletes de salvação a 750 marinheiros que provem nadar de bruços entre o Cais da Ribeira e a Baía de Luanda. Salvar-se-ão os tripulantes mais vigorosos e destros. Já assim era na selecção de negros para as plantações e minas de ouro. Os restantes 800 serão timbrados como excedentes e incompetentes, inadaptados às lides do corso e às cutiladas dos fortins: baixas de ciladas, escorbutos, enjoos, vilezas e rumores. Em contrapartida, os capitães da finança luso-angolana, pela voz de Mira Diogo Cão Amaral, enaltecem a credibilidade e a capacidade do grupo investidor-saldador, dando como beneplácito a figura do homem mais rico de Portugal: Amé(rico) Amorim. Majestade, não conheceis este Amé(rico) das ligações à Corte? Como vós é Rei, embora da cortiça. Como vós é soberano, mas do petróleo. E que mais recordareis? Há anos integrou uma delegação de eminências capitalistas que foi demonstrar ardor pátrio junto da Corte, apelando às corporações para que mantivessem a direcção e o controlo accionista em Portugal. Amé(rico) não demoraria a passar para controlo espanhol o BNCI/Banco Nacional de Crédito Imobiliário. Patriotismo nunca faltou aos grupos de pressão e da abdicação: anteriormente já Amé(rico) havia vendido a espanhóis a posição no BCP. Não escasseiam elementos retratísticos. Aqui há anos envolveu-se num colossal processo de desvio de fundos europeus, sendo bafejado pelas prateleiras da morosidade com a prescrição. Não vai há séculos que ordenou o despedimento preventivo de dezenas de súbditos, estribado em apreensões sobre o futuro das rolhas e de outros artigos de sobro. Mas os resultados surpreenderam o Rei de Santa Maria da Feira. Sempre a crescer. Sempre a enriquecer. Principalmente à medida que a miséria alastra e o Estado não só privatiza empresas e serviços como se encontra refém dos privatizadores. Senhor, Portugal deve muito aos ricos ou serão os ricos que devem muito a Portugal?

Majestade, vou terminar com Vossa licença. A Nação jaz guarnecida de panos roxos da Paixão, à mercê dos passos e compassos da Troika, aparentemente rendida a moedeiros autóctones e internacionais, à capitulação das fidalguias, às vénias das criadagens. Não abusarei da tortura da verdade. Deus se compadeça da Vossa visão e da Vossa audição, hoje, na qualidade de 19.º chefe de Estado da República, ontem, como 21.º chefe de Estado da Monarquia, a fim de que os olhos de todos os seres que Francisco de Assis amou forneçam clareza ao Vosso olhar e o troar dos canhões e dos carrilhões Vos faça entender que, mais tarde ou mais cedo, não há bom ladrão que se exima à justiça nem rei que escape à peste. E a peste será a cólera dos justos. Vós e os ministros, assessores e magistrados a fomentaram. Vorazes e altivos agora. Cabisbaixos Vos sentireis depois. Cercados pelo alvoroço das arraias de Fernão Lopes. Envergareis as túnicas do opróbrio. Devolvereis as dezenas de BPN's que levaram Portugal a contrair dívidas para liquidar dívidas, a ditar a carência colectiva em favor da ostentação da Corte e dos cortesãos. Senhor, por que continuais de sobrolho carregado? D. João IV faleceu um ano após o meu sermão. Não vos fixeis nos adejos do infausto. Porventura estareis a rever-Vos no destino dos príncipes de Israel que sofreram o cativeiro por abandonarem o povo de Deus aos lobos?

Principes ejus in medio illius, quasi lupi rapientes praedam (Ezequiel, 22, 27).

por César Príncipe
Escritor/Jornalista.

domingo, 28 de agosto de 2011

sábado, 13 de agosto de 2011

é tarde, muito tarde da noite

É tarde, muito tarde da noite,
trabalhei hoje muito, tive de sair, falei com vária gente,
voltei, ouço música, estou terrivelmente cansado.
Exactamente terrivelmente com a sua banalidade
é o que pode dar a medida do meu cansaço.
Como estou cansado. De ter trabalhado muito,
ter feito um grande esforço para depois
interessar-me por outras pessoas
quando estou cansado demais para me interessarem as pessoas.

E é tarde, devia ter-me deitado mais cedo,
há muito que devera estar a dormir.
Mas estou acordado com o meu cansaço e a ouvir música.
Desfeito de cansaço,incapaz de pensar, incapaz de olhar,
totalmente incapaz até de repousar à força de cansaço.
Um cansaço terrível
da vida, das pessoas, de mim, de tudo.
E fumo cigarro após cigarro no desespero
de estar tão cansado. E ouço música
(por sinal a sonata para violino e piano de César Franck,
e depois os Wesendonck Lieder)
num puro cansaço de dissolver-me
como Brunhilda ou como Isoldano que não aceitarei nunca,
l' amor che muove il sole e l' altre stelle.
Nada há de comum entre esse amor de que estou cansado,
e o outro que não ama, apenas queima e passa,
e de cuja dissolução no espaço e no tempo em que vivo
estou mais cansado ainda. Dissolvam-se essas damas
que eram princesas ou valquírias, se preferem, no eterno.

Eu estou cansado de não me dissolver
continuamente em cada instante da vida,
ou das pessoas, ou de mim, ou de tudo.
Qu' ai-je à faire de l' eternel? I live here.
Non abbiamo confusion. E aqui é que morrerei
danado de cansaço, como hoje estou
tão terrivelmente cansado.

Jorge de Sena
Lisboa, circa 1948

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Viver vale a pena







Viver vale a pena,

viver está muito, mas muito mais além das mesquinhezas, da realidade política...
do se ganha ou do se perde.

E está também muito além da realidade pessoal.

Na vida podemos ganhar ou perder,
mas isso tem pouca importância em relação a esse outro mundo que nos espera,
esse outro mundo possível, que está na barriga deste.

Este mundo onde vivemos é um mundo infame.
Não é muito incentivador o mundo onde nascemos
mas, há um outro mundo na barriga deste,
esperando.

Esse é um mundo diferente,
diferente e de parto complicado.
e não é fácil o seu nascimento.

Mas ele pulsa no mundo que estamos!!!

Um mundo que "pode ser" pulsando no mundo que "é".

domingo, 15 de maio de 2011

tal qual um veleiro num porto...

Eu fiquei só, como os veleiros nos portos... silenciosos

Mas assim te possuirei mais do que ninguém

Porque neste meu porto, estarei sempre pronta a partir

E todas as lamentações do mar, do vento, do céu e das estrelas

Serão a tua voz presente, a tua voz ausente, a tua voz em paz!!

em memória do Adolfo

domingo, 1 de maio de 2011

A todas as mães que lutam para criar e educar os seus filhos




















A imagem de Florence Owens Thompson, uma mãe migrante e os seus sete filhos, tornou-se o ícone da miséria provocada pela grande depressão de 1929.

No entanto, a imagem desta mulher fotografada amparando nos ombros dois dos seus filhos e um terceiro nos braços, que carrega no rosto o semblante latente da fome, demonstra uma dignidade pulsante, uma força que a faz sobreviver às hostilidades de um mundo caótico.

Não é a mulher que posa para a fotografia, mas sim a mãe, um ser totalmente desprovido das vaidades femininas, com mãos maltratadas, feitas para afagar a prole no momento da fome. As rugas na testa e em volta dos olhos iluminam esta mulher que nos transmite a força da maternidade perante a crise.

Aos trinta e dois anos, a mãe Florence Owens Thompson representa a espinha dorsal da sua família, traz as marcas profundas do seu tempo, a juventude esvai-se com a fome que a assombra e a sua beleza agreste traz toda a profundidade do mundo!!

Um bom dia da Mãe!!




Fotos: Migrant Mother by Dorothea Lange. Fotografias tiradas em Nipomo, Califórnia, entre Fevereiro e Março de 1936

sábado, 16 de abril de 2011

não me peças para ter paciência!!

Dizes-me, ou temos paciência ou sucumbimos, mas eu estou numa altura que prefiro não ter paciência e eventualmente sucumbir!!

tudo porque a paciência me trouxe até aqui, a um limbo, uma situação de incerteza que provoca o medo e que me tolhe os movimentos!

como? perguntas, e eu examino o significado da palavra..

Paciência = sf (lat patientia) 1 Qualidade de paciente. 2 Virtude de quem suporta males e incómodos sem queixumes nem revolta. 3 Qualidade de quem espera com calma o que tarda. 4 Perseverança em continuar um trabalho, apesar de suas dificuldades e demora. 5 tolerância, resignação, perseverança, constância, pachorra, longanimidade, fleuma, eupatia e por aí fora…
Paciência!: interjeição com que se exorta a essa virtude. Paciência de Jó: grande paciência, como a desse patriarca bíblico.


Toda a minha vida foi pautada por paciência, tolerei, perseverei, suportei sem queixumes nem revolta, resignei-me mesmo a certas condições e???

tal como dizes, a vida não pára, o que é bem verdade, mas se eu puser de lado a paciência, a vida também não vai parar!! Claro que posso adoecer e sucumbir por me desgastar mas…

Ultimamente, tenho pensado muito nisto, e sei que por ter paciência fui tolerante e suportei, engoli e resignei-me e, para não me queixar adoeci mas, por perseverar não me revoltei, aturei e insisti pacientemente em muitas áreas da minha vida por coisas das quais, algumas delas me orgulho pelo êxito alcançado mas, porque aguardei, tolerei e perseverei, perdi muito tempo, momentos nunca mais recuperados desta vida tão rara!!

E por isso hoje digo, Chega!! Quero viver em tempo real, sem paciência, quero desgastar-me, enamorar-me, apaixonar-me, revoltar-me, rebelar-me, impacientar-me, desassossegar-me sim, porque a vida é rara e eu quero vivê-la sem paninhos quentes!!

Em final de conversa, quero dizer que o contrário de paciência para mim não é fúria ou raiva ou ira ou cólera mas sim uma outra coisa muito mais bonita, é viver sentindo na pele o doce e o amargo de todos os minutos da vida e, se nos farpearem ou ferirem, ou mesmo se nos aguilhoarem é preciso perder a paciência e gritar bem alto a nossa dor!!

domingo, 23 de janeiro de 2011

eu???!!!!


"Eu nunca fui uma moça bem-comportada.
Pudera, nunca tive vocação pra alegria tímida, pra paixão sem orgasmos múltiplos ou pro amor mal resolvido, sem soluços.
Eu quero da vida o que ela tem de cru e de belo. Não estou aqui pra que gostem de mim. Estou aqui pra aprender a gostar de cada detalhe que tenho. E pra seduzir somente o que me acrescenta!
Adoro a poesia e gosto de descascá-la até à fractura exposta da palavra.
A palavra é meu inferno e minha paz.
Sou dramática, intensa, transitória e tenho uma alegria em mim que me deixa exausta.
Eu sei sorrir com os olhos e gargalhar com o corpo todo.
Sei chorar toda encolhida abraçando as pernas.
Por isso, não me venha com meios-termos, com mais ou menos ou com qualquer coisa. Venha a mim com corpo, alma, vísceras, tripas e falta de ar…
Eu acredito é em suspiros, mãos massageando o peito ofegante de saudades intermináveis, em alegrias explosivas, em olhares faiscantes, em sorrisos com os olhos, em abraços que trazem pra vida a gente.
Acredito em coisas sinceramente compartilhadas.
Em gente que fala tocando no outro, de alguma forma, no toque mesmo, na voz, ou no conteúdo.
Eu acredito em profundidades.
E tenho medo de altura, mas não evito meus abismos.
São eles que me dão a dimensão do que sou."

M. de Queiroz

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Só um Mundo de Amor pode Durar a Vida Inteira


Há coisas que não são para se perceberem. Esta é uma delas. Tenho uma coisa para dizer e não sei como hei-de dizê-la. Muito do que se segue pode ser, por isso, incompreensível. A culpa é minha. O que for incompreensível não é mesmo para se perceber. Não é por falta de clareza. Serei muito claro. Eu próprio percebo pouco do que tenho para dizer. Mas tenho de dizê-lo.
O que quero é fazer o elogio do amor puro. Parece-me que já ninguém se apaixona de verdade. Já ninguém quer viver um amor impossível. Já ninguém aceita amar sem uma razão. Hoje as pessoas apaixonam-se por uma questão de prática. Porque dá jeito. Porque são colegas e estão ali mesmo ao lado. Porque se dão bem e não se chateiam muito. Porque faz sentido. Porque é mais barato, por causa da casa. Por causa da cama. Por causa das cuecas e das calças e das contas da lavandaria.
Hoje em dia as pessoas fazem contratos pré-nupciais, discutem tudo de antemão, fazem planos e à mínima merdinha entram logo em "diálogo". O amor passou a ser passível de ser combinado. Os amantes tornaram-se sócios. Reúnem-se, discutem problemas, tomam decisões. O amor transformou-se numa variante psico-sócio-bio-ecológica de camaradagem. A paixão, que devia ser desmedida, é na medida do possível. O amor tornou-se uma questão prática. O resultado é que as pessoas, em vez de se apaixonarem de verdade, ficam "praticamente" apaixonadas.

Eu quero fazer o elogio do amor puro, do amor cego, do amor estúpido, do amor doente, do único amor verdadeiro que há, estou farto de conversas, farto de compreensões, farto de conveniências de serviço. Nunca vi namorados tão embrutecidos, tão cobardes e tão comodistas como os de hoje. Incapazes de um gesto largo, de correr um risco, de um rasgo de ousadia, são uma raça de telefoneiros e capangas de cantina, malta do "tá bem, tudo bem", tomadores de bicas, alcançadores de compromissos, bananóides, borra-botas, matadores do romance, romanticidas. Já ninguém se apaixona? Já ninguém aceita a paixão pura, a saudade sem fim, a tristeza, o desequilíbrio, o medo, o custo, o amor, a doença que é como um cancro a comer-nos o coração e que nos canta no peito ao mesmo tempo?
O amor é uma coisa, a vida é outra. O amor não é para ser uma ajudinha. Não é para ser o alívio, o repouso, o intervalo, a pancadinha nas costas, a pausa que refresca, o pronto-socorro da tortuosa estrada da vida, o nosso "dá lá um jeitinho sentimental". Odeio esta mania contemporânea por sopas e descanso. Odeio os novos casalinhos. Para onde quer que se olhe, já não se vê romance, gritaria, maluquice, facada, abraços, flores. O amor fechou a loja. Foi trespassada ao pessoal da pantufa e da serenidade. Amor é amor. É essa beleza. É esse perigo. O nosso amor não é para nos compreender, não é para nos ajudar, não é para nos fazer felizes. Tanto pode como não pode. Tanto faz. É uma questão de azar.

O nosso amor não é para nos amar, para nos levar de repente ao céu, a tempo ainda de apanhar um bocadinho de inferno aberto. O amor é uma coisa, a vida é outra. A vida às vezes mata o amor. A "vidinha" é uma convivência assassina. O amor puro não é um meio, não é um fim, não é um princípio, não é um destino. O amor puro é uma condição. Tem tanto a ver com a vida de cada um como o clima. O amor não se percebe. Não é para perceber. O amor é um estado de quem se sente. O amor é a nossa alma. É a nossa alma a desatar. A desatar a correr atrás do que não sabe, não apanha, não larga, não compreende.
O amor é uma verdade. É por isso que a ilusão é necessária. A ilusão é bonita, não faz mal. Que se invente e minta e sonhe o que quiser. O amor é uma coisa, a vida é outra. A realidade pode matar, o amor é mais bonito que a vida. A vida que se lixe. Num momento, num olhar, o coração apanha-se para sempre. Ama-se alguém. Por muito longe, por muito difícil, por muito desesperadamente. O coração guarda o que se nos escapa das mãos. E durante o dia e durante a vida, quando não esta lá quem se ama, não é ela que nos acompanha - é o nosso amor, o amor que se lhe tem. Não é para perceber. É sinal de amor puro não se perceber, amar e não se ter, querer e não guardar a esperança, doer sem ficar magoado, viver sozinho, triste, mas mais acompanhado de quem vive feliz. Não se pode ceder. Não se pode resistir. A vida é uma coisa, o amor é outra. A vida dura a Vida inteira, o amor não. Só um mundo de amor pode durar a vida inteira. E valê-la também.

Miguel Esteves Cardoso, in 'Jornal Expresso'

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

O difícil que é



O que passa na cabeça de uma pessoa,
para que numa bela tarde de Janeiro, um dia diferentes dos anteriores porque nesse dia o sol brilhava no céu, terminado um almoço com um filho, um almoço normal igual ao dos outros dias, desista de viver e termine com a sua vida?



o que poderá passar pela cabeça de uma pessoa
que tem filhos que adora,
que tem um namorado com quem se dá bem,
que tem um ex por quem ainda nutre amor,
que tem uma família que ama e que a ama
que tem uma profissão que gosta
que tem um negócio ao qual se entrega de corpo e alma
que tem a calma e confiança dada pela meia idade
que tem saúde para viver pelo menos mais 40 anos
que tem solidez financeira

o que poderá passar pela cabeça de uma pessoa nesta situação,
uma pessoa que monta uma corda no tecto e se enforca?

e...
como é que nós amigos não nos apercebemos que se passava qualquer coisa de errado?
como é que nós amigos não conseguimos prever que o que ia acontecer?
como é que nós amigos, que convivemos com esta pessoa assiduamente, não nos apercebemos que havia um desequilíbrio emocional perigoso?
como é que nós amigos não lhe telefonámos nesse dia e àquela hora?

não é fácil aceitar que o nosso amigo possa ter desistido da vida
não é fácil aceitar que o nosso amigo não tenha falado connosco antes
não é fácil aceitar que o nosso amigo não nos tenha tenha confiado o seu desespero
não é fácil aceitar que o nosso amigo não nos tenha telefonado a pedir ajuda
não é fácil aceitar que não pudéssemos fazer alguma coisa para evitar este horror
não é nada fácil perder um amigo assim!!

e...
o difícil que é para um filho acreditar que não podia ter feito nada
o difícil que é para uma filho aceitar que não poderia ter lido nas entrelinhas
o difícil que é para um filho aceitar que foi uma decisão tomada sem reflectir
o difícil que é para um filho aceitar que foi uma decisão tomada em 2 minutos
o difícil que é para um filho não ver este acto com uma forma de puro egoísmo
o difícil que é para um filho pensar, ao longo da vida, que nunca de despediu
o difícil que é para um filho quando se lembra do ultimo beijo
o difícil que é para um filho aceitar que não foi suficientemente importante
o difícil que é para um filho saber que não vai ouvir mais, amo-te meu filho
o difícil que é para um filho viver com estes sentimentos
o difícil que é para um filho viver sem o pai
o difícil que é para um filho aceitar este suicídio
o difícil que é para um filho continuar a viver
em harmonia consigo,
o difícil que é!!

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Travessuras de uma menina má


Com que então os desastres amorosos são os que dão os derrames cerebrais??

hummm... cheira-me a invenção do Vargas Llosa

sábado, 8 de janeiro de 2011

7 Janeiro 2011


Hoje está um dia lindo deste lado de la cañada!! Era assim que se referia ao Atlântico o meu amigo do continente sul americano.

Ele não está aqui para ver mas, estamos já em pleno Inverno e a temperatura é amena. Acima, o céu quase limpo mostra algumas pinceladas de nuvens, como se um pintor, tivesse limpo a tinta branca do seu pincel, ao firmamento.

Enchi os pulmões. Um ar limpo e leve com cheiro a maresia trouxe-me de imediato à memória tempos de férias, repletos de ternura e amor, épocas de grande paixão e beleza.

Esta visão e sensações puseram-me tão feliz que senti um largo sorriso a abrir-se-me no rosto! Dei comigo a rir de prazer de estar viva, de estar ali, em quarto minguante da vida, ainda com uma enorme prazer e vontade de a viver, plenamente, continuando a sonhar e a acreditar ser possível ainda voltar a apaixonar-me!

Apanhei o comboio em Santo Amaro, o percurso até Lisboa estende-se ao longo do estuário do Tejo. As suas águas um pouco alteradas pelo vento que sopra, tornaram-se castanho esverdeado e milhares de olhinhos brancos aqui e acolá vêem espreitar à superfície para logo desaparecerem e surgirem noutro lado.

Sei que a vida só vale a pena enquanto puder sentir tudo isto, enquanto vir beleza nas coisas simples da vida, enquanto sentir ternura ao olhar dentro dos olhos de alguém e ter vontade de me entregar e partilhar alegrias e tristezas, mas sempre e acima de tudo, alegria e amor!

quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Abro mão da primavera para que continues me olhando



Quero apenas cinco coisas..
Primeiro é o amor sem fim
A segunda é ver o outono
A terceira é o grave inverno
Em quarto lugar o verão
A quinta coisa são os teus olhos
Não quero dormir sem os teus olhos.
Não quero ser... sem que me olhes.
Abro mão da primavera para que continues me olhando.

Pablo Neruda

terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Lindo!!!



Porcelain Unicorn by Keegan Wilcox
Grand Prize Winner of the Phillips Tell it your way competition

Os sentimentos que este pequeno filme faz brotar são indescritíveis! A sensibilidade na escolha do tema, da ternura que transmite, a raiva surda contra o poder, a beleza da partilha, a inocência...